Antes de mais nada é bom esclarecer que luthier é um estado permanente. Mesmo que não ponha a mão em uma ferramenta durante anos. Penso que tocar violão é parecido, mas menos grave. Há alternativas, como piano, clarineta…. Donde, esclareço que sou luthier. Por outro lado, já toquei violão.
Por que essa explicação? Porque a anedota que segue é uma história de luthier, sobre um luthier. Um grande luthier, e um grande violonista, e vamos parar por aqui para não parecer exagero. Pois é, toda vez que, com olhar de luthier, se pergunta ao Sergio como ele fez algo que ao mesmo tempo parece impossível e feito sem que a tarefa oferecesse nenhuma resistência, a resposta é sempre a mesma. E sempre nos faz sorrir. O diálogo é: “Sergio, como você fez isso!!!?” (imaginem a pergunta feita com tom de surpresa diante do impossível alcançado. Sim continuamos a nos surpreender). A resposta, perfeita, dita com um sorriso bem humorado é: “Com grande dificuldade!”.
E não pensem que ao responder assim o Sergio está mentindo ou tentando se valorizar por ter feito algo simples, apresentando como complexo. Na verdade toda a graça das coisas para ele está nessa tal “grande dificuldade”. Se você ainda não leu o livro, quando você ler, verá. Se já leu, volte a ele. Está lá, no início do capítulo 7, como quem fala de um video game. “Você fica obsessivamente fazendo aquilo e aí passa de nível”. E, apesar do Sergio não dar aulas de luteria ou violão,— ao menos aulas formais — ao potencial aluno atento a curta resposta, como um koan de um mestre Zen, contém todo o ensinamento necessário.
O que é obstáculo para muitos para ele é o meio. E porque toda essa contação de história? Por que este livro é sobre o Sérgio. Mas também pode ser útil como uma referência, um exemplo, para jovens, ou não tão jovens — eu me incluo entre os jovens, é bom esclarecer — que querem e/ou precisam de um bom exemplo, não importa o que decidam fazer de suas vidas. A perfeição é uma meta defendida pelo goleiro que joga na Seleção, disse um dono de um violão Abreu. Mas o objetivo não é a perfeição (pois, lembra a mesma canção, é uma meta inatingível), mas a batalha contra o obstáculo natural, sem o qual a vida talvez não tivesse tanta graça.
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Mario Jorge Passos é luthier
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